Bendito direito de maravilhar-se!

Para uma criança, o mundo é um grande laboratório. Muitas são as descobertas, tantas as experiências. Por quê? é pergunta de praxe: “por que o céu é azul?”, “por que existe o inverno?”, “por que a água do mar é salgada?” 

A curiosidade não cessa nunca. Quer saber sobre a anatomia e a vida dos insetos, a alimentação dos animais, o crescimento e a floração das plantas, entre outras inúmeras questões. Toda criança tem um quê de cientista, fazendo experimentos, testando hipóteses, aprendendo com os erros. Atesta a alquimia dos alimentos mexendo com fogo, coloca em xeque a teoria da gravidade experimentando a consistência dos objetos, faz aviões de papel para observar a força do ar e barcos de papel para examinar a força da água.

A criança também considera o mundo como um grande atelier de arte. Encanta-se com as cores do arco-íris e com a forma das asas da borboleta. A Natureza é a sua grande fonte de inspiração. Rabisca e desenha tentando reproduzir o que a sua mente é capaz de registrar. Mistura tintas de cores diferentes para inventar uma nova. 

A criança é a atenção, a inteireza, a presença, a entrega, a abundância da vida, o encantamento com o mundo, a ausência do medo até que… o adulto entra em cena. E ele nunca vem só, sempre traz o Mórbido (personagem do meu livro O Velho e o Menino que representa o medo) consigo, preocupado com os noticiários fúnebres, a violência apregoada pela mídia, as guerras e mortes, as corrupções e ódios. E então acabou-se o que era doce. 

“Desce daí”, “não mexe nisso”, “assim você vai se machucar”, “olhe que o bicho morde”, “não chegue perto”, “você vai levar um choque”, “afaste-se”, “cuidado!”,  “perigo!”.

É claro que os adultos têm de proteger as crianças, mas não deveriam reprimir o que é natural nelas: a energia, a curiosidade e o espírito empreendedor. Muito menos seus sonhos. Crianças são moldadas e remodeladas quase sempre influenciadas pelo medo que os adultos sentem. À medida que crescem, tornam-se pessoas assustadas e acuadas, com talentos represados, propensas ao mundo da criatura, não à vida de criadora. 

Tratemos de inverter a seta. Ao invés das crianças desaprenderem como os adultos, os adultos deveriam aprender com as crianças. O ideal (e não utópico), portanto, seria resgatar aquela curiosidade cercada de “porquês”, exercitar a engenhosidade e a criatividade, sacudir o pó do marasmo e do sedentarismo, dar asas à imaginação, reativar os desejos e aquela verve empreendedora de quando os sonhos eram cercados de esperança.

Que a gente nunca perca o direito e o dever de maravilhar-se!

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