Vamos aprender com Elza Soares

Começo de ano. Aproveito um caderno de anotações moleskine para rabiscar intenções, reforçar valores, ajustar o propósito, não sem antes fazer uma breve avaliação do ano que passou. Prefiro escrever à mão do que no computador. Faço gráficos, traço esquemas, crio mapas mentais. “E agora?” pergunto a mim mesmo, tentando pensar direções para realizar o meu propósito. “O que esperar do novo ano?”, reitero, ao  buscar conexões entre condições externas e intenções internas.

Em matéria do jornalista Lucas Brêda para a Folha de S.Paulo (edição de 20/01/2023), soube que a diva da canção brasileira adotava a mesma prática. Registrava, em cadernos, frases soltas, anotações simples, ideias e aforismos.  E buscava respostas para questões que se fazia.

Vale, aqui, uma breve retrospectiva de sua carreira. Elza teve uma vida turbulenta desde a infância, em família de extrema pobreza. Quando se apresentou pela primeira vez, na década de 1950, foi trajando um vestido que sua mãe teve de ajustar com alfinetes ao corpo magérrimo da garota. O apresentador lhe perguntou de onde ela vinha e a caloura respondeu sem hesitar: “do planeta fome”.

Sua carreira, da mesma forma que a vida, sofreu altos e baixos. Embora já tivesse sido considerada a “melhor cantora do milênio” pela BBC de Londres, Elza vivia um período de ostracismo, esquecida pelo público. Naquele início de ano, ela rabiscou a pergunta: “O que você quer, 2014?”

A diva não perguntou o que ela queria para o novo ano, mas o que o novo ano queria dela. Era a virada de chave.

Sincronicidades à vista, foi convidada a gravar um álbum de inéditas, com novos compositores, algo que nunca tinha acontecido nos seus 60 anos de carreira. “Mulher do fim do mundo” foi lançado em 2015 e considerado o melhor disco do ano, conquistando o Grammy Latino. Na mesma linha, os dois discos seguintes foram bem recebidos pela crítica.

Elza passou a cantar para públicos muito maiores. Até nos deixar, em janeiro de 2022, aos 91 anos, sua agenda estava repleta de compromissos.

Versos de Gonzaguinha estão anotados em seu diário: “não é a doença que acaba com a gente / deixando esmagada a vida no chão / é a estranha saudade do que ainda não vivi”. Em idade avançada, Elza foi celebrada como uma das maiores cantoras brasileiras de todos os tempos o os seus três últimos discos são considerados os melhores de toda a sua carreira.

O que você quer, 2023? Quando a pergunta é certa, o tempo e a vida respondem com generosidade. É o que Elza Soares nos ensina. E o que podemos aprender, com respeito e admiração.

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